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O risco de anestesia genital depois de interromper o uso de antidepressivos

Estudo mostra que até 13.2% dos pacientes relatam essa condição após o fim do tratamento. Como os antidepressivos afetam o desejo sexual Durante a pandemia,...

O risco de anestesia genital depois de interromper o uso de antidepressivos
O risco de anestesia genital depois de interromper o uso de antidepressivos (Foto: Reprodução)

Estudo mostra que até 13.2% dos pacientes relatam essa condição após o fim do tratamento. Como os antidepressivos afetam o desejo sexual Durante a pandemia, J. não soube lidar com a ansiedade provocada pelo isolamento e, com a devida orientação de um psiquiatra, começou a fazer uso de antidepressivos. Quando a situação se normalizou, ficou feliz de poder abrir mão da medicação, mas sofreu um choque: ao suspender o remédio, passou a enfrentar um quadro de disfunção sexual severa. Pior: perdera toda a sensibilidade dos genitais. M. chegou aos 30 anos sem ter tido um orgasmo. Ao rever seu histórico médico, descobriu que, aos 11 anos, havia utilizado antidepressivos e se pergunta se isso não foi determinante para uma disfunção sexual permanente. O que J. e M. têm em comum é uma condição pouco compreendida, mas que começa a chamar a atenção: a disfunção sexual pós-antidepressivos (Post-SSRI Sexual Dysfunction ou PSSD). Para entender melhor a questão, conversei com o pesquisador Pedro Marinho, que faz doutorado em farmacologia na University of Toronto (Canadá). Ele é coautor de artigo sobre o tema publicado recentemente na prestigiada revista científica Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology. A disfunção sexual pós-antidepressivos pode atingir até 13.2% dos pacientes que fizeram uso do medicamento após a interrupção do tratamento Couplehealthcare para Pixabay “Desde a década de 1990, a disfunção sexual é um efeito colateral bastante conhecido dos antidepressivos, que atinge cerca de 75% dos pacientes. O que não tem a mesma visibilidade é que essa condição pode continuar por tempo indefinido, e até piorar, depois da interrupção do tratamento. Especificamente, me refiro aos inibidores seletivos da recaptação da serotonina e inibidores seletivos da recaptação da serotonina e da noradrenalina”, explica Marinho. “São medicamentos usados para um leque amplo de transtornos, como ansiedade, TOC, depressão, pânico, dor crônica e síndrome do intestino irritável. Nos Estados Unidos, 12% da população fazem uso contínuo desses remédios. Contudo, em um grupo de pacientes, a disfunção sexual não só persiste indefinidamente como, com frequência, se torna mais severa. O sintoma cardinal (principal) da PSSD é a anestesia genital. A anestesia não está atrelada a outros sintomas de depressão ou distúrbios psiquiátricos, é algo bem específico. Muitos chegam a afirmar que se sentem castrados quimicamente, que há uma desconexão total entre o cérebro e os genitais”, acrescenta. Os sintomas incluem ainda redução ou perda da libido, inabilidade de ter orgasmos, disfunção erétil em homens e falta de lubrificação vaginal em mulheres. A PSSD ocorre em ambos os sexos, em todas as faixas etárias. Como se trata de uma condição pouco conhecida, os pacientes se deparam com a descrença dos profissionais de saúde quando relatam seus sintomas – a queixa é quase sempre associada a um quadro de depressão, como se não houvesse qualquer ligação com o medicamento. “Quem tomou antidepressivos antes da adolescência, ou das primeiras relações sexuais, pode não saber o real impacto da medicação em sua sexualidade, por não dispor do baseline (um estado anterior) para comparar. Há pessoas que acreditavam ser assexuais, até se darem conta de que o fato de não sentirem seus órgãos genitais, ou de não terem um orgasmo, talvez esteja vinculado à utilização do medicamento quando muito jovens. Apesar de existirem diversos antigos científicos descrevendo o problema, não há tratamentos para a PSSD”, diz Marinho. Há comunidades, como a PSSD Network e a Canadian PSSD Society, e grupos de apoio e fóruns on-line no Reddit e Facebook. Além de dar suporte emocional aos membros, um dos objetivos dessas associações é levantar fundos para pesquisa. Veículos consagrados, como os jornais “The New York Times” e “The Guardian”, também se debruçaram sobre o assunto. O artigo, intitulado “Frequency of self-reported persistent post-treatment genital hypoesthesia among past antidepressant users: a cross-sectional survey of sexual and gender minority youth in Canada and the US”, investigou a prevalência da anestesia (hipoestesia) genital em pacientes que suspenderam o tratamento com antidepressivos nos EUA e Canadá. “Nossos dados dão uma estimativa de prevalência de que até 13.2% dos pacientes reportaram a persistência da anestesia genital após a interrupção do tratamento com antidepressivos, quando comparados com outros medicamentos psiquiátricos. Estamos diante de um cenário no qual uma quantidade significativa de indivíduos está sob o risco de desenvolver disfunção sexual irreversível após utilizar uma classe de medicamentos extremamente comum. Devido ao aumento de prescrições durante a pandemia, é possível que o número de pessoas com essa condição cresça muito”, alerta o pesquisador. A colunista fará um breve recesso e estará de volta no dia 3 de novembro.